

Já são 28 dias sem treinador, e o começo das maiores competições de clubes talvez tenha eclipsado um pouco sua crise. Aproveitei que vim nesta semana para Madri, capital da Espanha, para a cobertura de mais um prêmio Laureus e resolvi conversar com quem entende do assunto.
Propus ao Cafu, capitão do penta e campeão no tetra, jogador com mais jogos com a amarelinha e embaixador do prêmio, um bate-papo para tentar entender a crise no nosso selecionado. Quais os caminhos? De quem é a culpa? O que fazer? Neste espaço, tenho a liberdade de confessar que discordei das maiorias das respostas do ex-jogador. Mas não dá para ignorá-las quando o assunto é a seleção brasileira…
Você já viveu momentos difíceis com a seleção. Como enxerga a fase atual do time? É pior do que as que você enfrentou?
Foi pior, né? Em 1994. Mas a gente tinha capacidade de reverter tudo, e isso era o mais importante. A única diferença entre aquela crise e a atual está na indefinição dos treinadores. Isso atrapalha um pouco. Mas o Brasil vai ganhar, vai perder, vai jogar bem, vai jogar mal nas Eliminatórias — tudo isso é normal. As eliminatórias sul-americanas são das mais difíceis do mundo. Mesmo assim, o Brasil é o único pentacampeão. Temos cinco estrelas no peito. É um país a ser respeitado.
Se você, capitão, entrasse no vestiário da seleção hoje, o que diria aos jogadores?
Eu falaria sobre a importância de estar na seleção brasileira, da responsabilidade que cada um tem com o Brasil e do que eles representam para o povo. Diria para esquecer as críticas e pensar nas palavras boas: no que o pai, a mãe, os filhos, os amigos dizem. Eles sempre incentivam. É um momento difícil, sim. Os resultados não vêm, mas isso não define o que é a seleção. Ela é muito maior que esses momentos ruins. Os bons resultados vão chegar.
Você defende que o treinador da seleção seja brasileiro. Por quê?
Sim, eu colocaria um treinador brasileiro. Estamos a um ano e meio da Copa. É pouco tempo para trabalhar. Então, por que não escolher alguém que já conhece o futebol brasileiro, os jogadores, a cultura? Vejo nomes fortes como Rogério Ceni, Renato Gaúcho, o próprio Roger Machado no Internacional — que vem fazendo um excelente trabalho. Por que só pensar em estrangeiros, sem saber se vão ou não assumir?
Então por que Dorival Júnior não deu certo?
Quando os resultados não vêm, alguém tem que ser crucificado. E geralmente sobra para o treinador, o que, para mim, é uma grande injustiça. Mandar um técnico embora no meio de uma competição é uma falta de respeito absurda. Se o trabalho é interrompido no meio, é natural que o próximo chegue sob desconfiança. Pode acontecer com qualquer um: Dorival, Carlo Ancelotti, Renato Gaúcho… Se o Ancelotti perde os três primeiros jogos, vai ser mandado embora também? Então, por que não dar esse tempo para um brasileiro? Talvez o Dorival não tenha imposto seu estilo, seu esquema tático com firmeza. Mas isso só saberíamos se ele tivesse tido tempo.
Por que o Brasil forma tão poucos treinadores de elite em comparação a outros países, como Argentina ou Portugal? Dos que jogaram Copas de 1994 a 2018, só Filipe Luís, Ceni e Beletti viraram técnicos…
Boa pergunta. E, sinceramente, eu ainda não tenho essa resposta. Talvez seja pela falta de oportunidade. A CBF dá pouca chance para ex-jogadores que viraram técnicos. Só vamos saber se são bons treinadores dando oportunidade. E agora é o momento ideal para isso.
Você acha que o problema da seleção vai além do treinador?
Claro. O problema é nosso. A culpa é dos jogadores. Eu me coloco nesse lugar. Somos nós que jogamos. O presidente da CBF não joga, o treinador não joga, a torcida não entra em campo. Se fui escolhido para estar ali, tenho que representar. Temos que parar de colocar a culpa na diretoria, na comissão técnica… A responsabilidade é nossa.
Como você vê o envolvimento de jogadores com apostas esportivas?
Isso é um assunto delicado. Cada um dos envolvidos deve responder por si. A gente não sabe o que é verdade ou não. Sabemos que alguns já foram punidos, e isso é grave. Lá na Itália, isso já foi um problema no passado e continua. São escolhas — e também consequências.
O nome de Jorge Jesus é especulado como possível técnico da seleção. O que pensa disso?
Assim como o Jorge Jesus, o Ancelotti, o Abel Ferreira… todos são especulados. Mas essa indefinição atrapalha. Parece que estamos leiloando o cargo de técnico da seleção. E isso é ruim para o futebol brasileiro. Todos esses nomes têm capacidade, mas temos bons técnicos brasileiros também. Eu preferiria um treinador brasileiro. Somos o único país pentacampeão. Por que não dar esse ciclo até a Copa para um técnico nosso? Aí sim, após 2026, se quiser trazer um estrangeiro e começar do zero, tudo bem.
Você viveu o ciclo até a Copa de 2002. Essa troca constante de treinadores realmente atrapalha?
Sem dúvida. Trocar de técnico no meio do caminho é péssimo. Prejudica o planejamento, o estilo de jogo, tudo. O Brasil vai para a Copa, está praticamente classificado, então poderia ter mais paciência. Mas, quando o esquema é interrompido e outro treinador entra com um plano diferente, tudo se perde. A instabilidade é ruim. O Brasil é maior que isso. Precisamos de um técnico do início ao fim do ciclo.
THALESPÉDIA
Na onda de demissões de técnicos no Brasileirão — que acho que não vai parar por aí —, um dado me chama a atenção:
MAIS FINALIZAÇÕES NA TRAVE NO BRASILEIRÃO 2025
1° Sport – 4
2° Cruzeiro e Mirassol – 3
O líder no quesito é o lanterna do campeonato, único time que não venceu em cinco partidas, e o bom técnico Pepa, como esperado, balança no cargo.
Vale lembrar: ele subiu a equipe da Série B, foi campeão estadual, foi muito prejudicado pela arbitragem nas primeiras rodadas, está em um clube em reconstrução e agora periga ser mais um que perde seu emprego. E se ao menos metade das quatro bolas na trave tivesse entrado? Não deveria ser isso o que separa a convicção em um trabalho, como parece ter virado moda no Brasileirão.
AS COISAS MAIS LEGAIS QUE VOCÊ PODE LER NO ESPORTE DO GLOBO NESTA SEMANA
Recomendo muito a matéria do Rafael Oliveira sobre a diminuição do delay nas transmissões dos jogos. Me fez entender um mundo que eu não tinha ideia que existia.
E, como abri esta newsletter com uma entrevista que fiz em Madri, encerro recomendando outra: a com o tenista João Fonseca, que inicia a gira de saibro de olho em um sonhado confronto com o sérvio Novak Djokovic.
Essa Newsletter vai sair de férias por duas semaninhas. Ela volta a ser enviada no dia 15/5. Até lá!
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