

A vitória do Fluminense sobre o Bragantino é daqueles jogos que abrigam várias histórias ao longo de 90 minutos. É possível falar sobre o duelo tático, sobre o que se viu da primeira versão tricolor sob as ordens de Renato Gaúcho, da volta de Ganso, e de mais um dos tantos casos em que o futebol oferece uma chance de redenção a um jogador marcado pela arquibancada: desta vez, foi Martinelli. Mas o curioso neste agônico triunfo tricolor foi como todas essas histórias se cruzaram.
- Marcelo Barreto: O roubo do tempo de jogo e as fraudes ligadas a apostas se juntam às ameaças ao futebol brasileiro
- Gustavo Poli: A era da burrice
É possível começar pelo duelo de estratégias. Renato chegou ao Maracanã com dois dias no cargo, o que torna precipitado cobrá-lo ou atribuir a ele grandes mudanças. Mas os 45 minutos iniciais do Fluminense foram dos melhores do time em 2025. O novo treinador tricolor é conhecido por um futebol atraente com bola, e esse elemento até esteve presente na primeira etapa. No entanto, o que mais chamou atenção foi como o time impôs uma agressiva pressão na saída de bola do Bragantino.
Quando atacava, o Fluminense tinha como grande arma as aproximações, em especial pelo lado direito. Canobbio atravessava o campo para se juntar a Arias, Guga, por vezes Hércules, Lima ou até Cano. Foi numa infiltração de Hércules que surgiu a primeira grande oportunidade, mas foi num belo movimento de Canobbio, uma diagonal da ponta esquerda para o centro do ataque, que Lima abriu o placar. A defesa paulista não teve respostas para esse movimento do Fluminense no primeiro tempo.
Juntar jogadores em torno da bola é algo comum em equipes de Renato. A questão é entender se o time perdeu tal capacidade na segunda etapa por uma queda física, pelo crescimento do Bragantino ou por ter um treinador que mal trabalhou para estabelecer algum padrão. O fato é que, a esta altura, eram os visitantes que pressionavam: Jhon Jhon e Sasha sobre os zagueiros Thiago Silva e Freytes, enquanto Gabriel e Eric Ramires — uma das mudanças de Fernando Seabra no segundo tempo — apertavam os volantes. O Fluminense perdia controle, e aí surgiam as outras histórias do jogo.
Com Juninho Capixaba quase como um quarto meio-campista, o tricolor perdia meio-campo e sobrecarregava os volantes. Martinelli cedeu uma chance ao Bragantino ao se complicar após receber um passe ruim de Hércules, seu companheiro à frente da zaga. Virou alvo de vaias no Maracanã.
Em dificuldade, Renato decidiu mexer no time, dando origem à terceira história da partida: Ganso, de volta após um problema no coração. Já seria um tema, mas as circunstâncias em que entrou permitem outro debate. É claro que o retorno de um jogador de tanto nível será vital para a temporada tricolor, e ele precisa de jogos para ganhar ritmo. Fazia sentido Renato apostar nele para retomar o controle da bola, mas por outro lado era discutível se o momento era o mais propício: o meio-campo do Fluminense era envolvido por um rival mais vigoroso àquela altura. Ganso entrou num tricolor que já não oferecia opções de passe próximas e se resumia às corridas de Arias. Não parecia o cenário ideal. Martinelli e Hércules se viam obrigados a cobrir espaços grandes, e o Bragantino dominou até Pitta empatar. As histórias se cruzavam.
Nada indicava uma vitória tricolor, até Arias arrancar pela direita como quem carrega nas costas a equipe ao ataque. Ele ganhou o escanteio que terminou no gol da vitória, justamente marcado por Martinelli, que pode não ser o meio-campista dos sonhos da arquibancada, mas tampouco é merecedor de uma perseguição tão dura. O futebol sabe ser cruel, mas também sabe oferecer recompensas.
Tensão desnecessária
Outro jogo do Flamengo teve placar mais apertado que a superioridade do time. O que reforça um traço do elenco: há muitos pontas, de bom nível, mas poucos jogadores que ficam à vontade perto do gol. O time fez excelentes 30 minutos iniciais, reduziu a produção mais adiante, mas contou com um belo gol de Arrascaeta e decidiu o jogo quando o Vitória tentou atacar, abrindo espaços para os velocistas que Filipe Luís lançou.
Claro que nenhum time do Brasil poderá atravessar um calendário insano com 11 titulares. Então, há momentos em que é preciso estabelecer prioridades. Neste aspecto, é difícil entender o Vasco ter enfrentado o Melgar, pela Sul-Americana, com titulares, dias antes de se apresentar desfigurado contra o Corinthians, pelo Brasileiro. Não é só o Vasco. O Brasil tem dificuldade de tratar seu principal torneio com a devida nobreza.
Constrangimento
Na sexta-feira, a CBF divulgou um vídeo que, em resumo, dizia que o presidente estava presidindo, o diretor de seleções, dirigindo, os analistas, analisando. Não havia novidade. O objetivo, talvez, fosse tirar da pauta a espetacular reportagem da Revista Piauí, sobre a forma como a receita bilionária da entidade alimenta alianças, interesses, remunera dirigentes de federações e reforça a estrutura política que atrasa o futebol nacional.
This news was originally published on this post .
Be the first to leave a comment