

É senso comum no futebol que nenhum jogador gosta de ser substituído. Hoje, no entanto, cada minuto a mais em campo não é apenas sinônimo de “fominha”, mas também estratégia de valorização. Na nova ordem mundial do esporte mais popular do planeta, o atleta, desde a base, é o principal ativo do clube. Na equação final do mercado, espera-se dele retorno esportivo e financeiro. E os algoritmos apontam que a minutagem, sobretudo dos mais jovens, é a grande moeda do momento.
— Os clubes descobriram que o número de minutos jogados é o melhor preditor de valor futuro de um jovem jogador. Jogar é o que realmente forma um jogador, lhe dá visibilidade e o faz evoluir. O tempo em campo mostra quais são os mais fortes, que se lesionam menos — diz Eduardo Dias, CEO da Footure, consultoria responsável pela ferramenta de monitoramento do mercado Footlink.
Dias explica que os jogadores, em média, têm seu valor de mercado crescente até os 23, 24 anos. Após essa idade, a tendência é de queda — ainda que o jogador mais maduro dê retorno esportivo.
O Fluminense tem dois bons exemplos. O meia-atacante Jhon Arias, de 27 anos, vive seu auge físico e tem sido determinante nas vitórias do tricolor nas últimas temporadas. Hoje, ele é o atleta mais valioso do time principal ( 16 milhões de euros, segundo o site Transfermarket). O segundo é o jovem Martinelli cujo valor está estimado em 9 milhões de euros. O volante — posição naturalmente menos valorizada do que os homens de frente — é o sétimo jogador do Brasileiro até 23 anos com mais minutos jogados.
—Ele já está chegando à idade limite, mas ainda pode entregar valores ao Fluminense. O mercado para o Arias tende a diminuir com os anos — explica.
O olhar mais cuidadoso nos dados da base se torna fundamental para o modelo de negócios de cada clube. No Brasil, todos se assemelham sob um mesmo aspecto: são essencialmente exportadores dos maiores talentos do futebol, mas o país é apenas o 8º em faturamento pela venda de jogadores.
Seja Flamengo e Palmeiras, com receitas consolidadas de origens diversas, ou time de categorias inferiores, todos precisam vender jogadores para manter a eficiência financeira no mesmo patamar da esportiva.
E para maximizar esse ganho e fazer negociações de maneira mais ativa, cada detalhe conta. Até o mês e o ano (par ou ímpar) de nascimento faz diferença para os minutos em campo de cada jogador devido às idades de corte e as datas dos torneios internacionais. Nesse cenário, segundo Dias, as estatísticas de gol podem até ser menos relevante do que o tempo de exposição:
—É mais importante a minutagem com a qual ele chega ao profissional, pois a relevância do número de gols depende do nível de competitividade dos jogos.
Conforme dados do Footlink, Palmeiras e Botafogo estão entre os times que deram mais minutos a jogadores sub-23 (atrás de Bragantino e Juventude) até a sétima rodada do Brasileiro.
Dois clubes que têm estruturado bem suas escolhas de jogadores de acordo com o potencial de venda. Recentemente, o Palmeiras negociou o zagueiro Vitor Reis, de 19 anos, por 37 milhões de euros para o Manchester City, na maior venda de um defensor do Brasil. Antes da venda, ele já tinha feito cerca de 1.500 minutos no profissional.
Não é apenas a minutagem, claro, que forma o valor de mercado de um jogador. Idade, posição, eficiência, passaporte europeu, liga e o clube em que jogam são outras variáveis determinantes.
— É o que explica o Neymar estar no Santos e não no Barcelona. Se machuca muito e não tem muitos minutos em campo — diz o cientista de dados Matheus Hanssen, que fez um estudo com a avaliação do valor de mercado de 30 mil jogadores.
Os treinadores também precisam estar alinhados à visão de negócio do clube. Mas, Carlos Leiria, que comandou o sub-20 do Botafogo, faz uma ponderação: os jogadores não são máquinas. É possível utilizar dados refinados, analistas de desempenho e toda a tecnologia possível para otimizar os ganhos do time. Contudo, é necessária certa dosagem, seja na base ou no profissional.
— A partir do quinto jogo seguido, o rendimento tende a cair. Controlar isso é parte da estratégia de valorização também — afirma o treinador, acrescentando. — Na base, os jogadores atuam menos vezes por semana, o que favorece o desenvolvimento técnico e tático. No entanto, a pressão por resultados e o alto número de competições exige dos clubes um planejamento coordenado entre comissão técnica, fisiologia e análise de desempenho. Há linha muito tênue, o desempenho tem que andar junto com o negócio para ter lucro. Mas da maneira como está vai perdendo qualidade.
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