

Pouco conhecido no cenário do futebol nacional, o médico e empresário Samir Xaud, de 41 anos, é candidato à eleição para a presidência da CBF, marcada para o próximo dia 25 pelo interventor Fernando Sarney. Ele nunca dirigiu uma entidade esportiva — já está eleito para presidir, a partir de 2027, a federação roraimense no lugar do pai, Zeca Xaud, que vai deixar o posto depois de 50 anos —, mas conta com o apoio de políticos com influência na entidade, além da maioria das 27 federações, cujo voto tem peso 3. Mas não dos 40 clubes das Séries A e B, com peso menor (respectivamente, 2 e 3). O pleito escolherá o presidente para o quadriênio 2025-29, após o afastamento de Ednaldo Rodrigues pela Justiça do Rio.
Com descendência árabe, o infectologista pode se inspirar no avô, sobre quem diz, com orgulho, ter sido o primeiro libanês a abrir um comércio em Roraima. Agora, ele mesmo pode ser o primeiro do estado a presidir a entidade máxima do futebol brasileiro.
Samir afirma que sua gestão terá como pilares a descentralização do poder (uma das maiores críticas a Ednaldo), a capacitação da arbitragem e o apoio à administração do Campeonato Brasileiro pelos clubes. Em relação à seleção, a promessa é não mexer em nada: deixar Carlo Ancelotti trabalhar.
Leia os principais pontos da entrevista de Samir Xaud ao GLOBO.
Os clubes reclamam de não terem sido ouvidos na condução do processo eleitoral. E, nos bastidores, sabe-se que há rejeição de parte deles ao seu nome. Como vê esta postura e o que fez para tentar mudar o cenário?
Na verdade, em relação ao processo eleitoral, a gente não tem controle. Parte de uma decisão judicial que foi colocada ao interventor e ele tem competência de chamar as eleições de acordo com o que acha ideal para o momento. Em relação ao contato com os clubes, eu fiz, sim. Inclusive com as ligas. Pedi que, antes de tomarem alguma decisão em relação ao lado que iriam apoiar, escutassem minhas propostas e ideias para o comando da CBF. Mas eu não consegui ser ouvido por eles. Apenas por oito.
Como foi essa procura?
Fiz os contatos com as lideranças das ligas, falei por telefone com eles. Pedi que a gente dialogasse, que o canal estava aberto. Mas, no final, acabou que fiquei sem retorno.
Acredita que sofre preconceito por ser de Roraima?
Olha, por parte dos clubes, não. Mas por parte de uns setores da imprensa, sim. Vejo algumas repercussões negativas em relação a isso. Mas o Norte faz parte do Brasil. Estamos num país democrático de direto. E acredito que Roraima não pode sofrer este tipo de retaliação por ser do extremo norte.
Roraima só possui um clube nas quatro divisões (o GAS, da Série D). Não é esta falta de representatividade que pode estar sendo vista como problema?
Para mim não há problema algum. Na verdade, o que estamos discutindo não é uma questão de clubes. Mas sim de competência para gerir uma entidade. É o que sempre falo: gerir uma entidade com dinheiro é fácil. Difícil é você gerir uma com poucos recursos, onde tem que se desdobrar para fazer futebol. A verdadeira gestão se faz mesmo nas menores localidades do Brasil.
Seria, então, por sua biografia curta como dirigente de futebol?
Primeiro: nasci e cresci dentro de um ambiente de estrutura de federação. Depois: tenho uma experiência em gestão pública de 12 anos, durante os quais já fui secretário de estado de saúde por duas vezes, diretor geral do maior hospital regional de Roraima por duas vezes e presidente do sindicato dos médicos de Roraima. Estou como vice da Federação Roraimense de Futebol e presidente eleito para o quadriênio 2027-31. Então, discutir gestão, se estou capacitado, preparado? Estou.
Muitos questionam minha legitimidade por vir de Roraima, pelo contexto dos clubes. No futebol brasileiro a gente precisa ter representantes de todo o país. Acredito que não é o estado ou região de onde a gente vem que vai falar se estou preparado ou não. E essa crítica rasa da imprensa esportiva, que se baseia apenas na minha origem, é muito triste. Os jornalistas se esquecem do exemplo do nosso amigo Armando Nogueira. Um dos criadores da TV Globo, dos maiores jornalistas da história do país, com muita história no esporte, veio da Região Norte. E olha que nasceu num local ainda mais distante que o meu, em Xapuri, no Acre. Então isso não quer dizer nada. A pessoa tem capacidades e estudos e não podem ser discriminadas por virem de uma federação pequena ou de uma região distante do Brasil.
Você já teve uma relação com a CBF, certo? Seja representando a federação ou por um contrato profissional que teve com a entidade.
Na verdade, esse contrato foi antes da minha entrada na estrutura da federação roraimense. Um contrato particular, como profissional da medicina esportiva. Faço um trabalho há oito anos com os clubes de Roraima onde dou assistência médica para eles, tratamento de lesões, faço acompanhamento e ajudo na performance dos atletas. É meu trabalho, é o que faço. Mas (o contrato com a CBF) foi por um ano, no qual prestei serviços médicos aos clubes daqui porque a gente não tinha um médico responsável para fazer tal serviço.
E sua atuação na federação?
Após o término do contrato foi quando comecei a ficar mais próximo da federação, e a gente começou a trabalhar na gestão e desenvolvimento do futebol do estado. Foi quando consegui ser vice da instituição. Logo em seguida, teve o primeiro pleito eleitoral do qual participei e fui eleito por aclamação pelos clubes de Roraima (9 de 10 votaram nele).
Falando sobre seu projeto, como avalia a CBF deixada pelo Ednaldo e o que pode acrescentar?
O que acontece hoje? A gente tem uma centralização de poder dentro da CBF. Víamos clubes e federações bem distantes das decisões tomadas pelo presidente. Na minha visão, tem que haver um plano de trabalho onde a gente promova uma descentralização desse poder. Onde a gente traga os personagens principais para dentro, que são clubes, federações e imprensa. E onde a gente tenha um contato direto com clubes, federações e atletas para, em conjunto, definir a melhor opção para o desenvolvimento do futebol brasileiro. São três pontos principais: essa descentralização do poder, a capacitação e melhora da nossa arbitragem e a formação da liga de clubes. Porque sou totalmente a favor da formação dela. Precisamos tirar isso do papel, ter um entendimento coletivo para que se execute a formação da liga.
Com o Campeonato Brasileiro administrado por ela?
Administrado por ela.
O que pensa sobre a chegada de Carlos Ancelotti?
Para mim é o melhor técnico do mundo. Vamos manter o contrato com ele. Já tivemos uma conversa prévia junto ao setor jurídico também. A gente acredita que, neste momento, ele é o melhor que há para a seleção. Precisamos garantir autonomia e segurança jurídica para ele. Fortalecê-lo e blindar todas as suas decisões. A ideia é que a CBF não interfira em nenhuma decisão de contratação ou convocação. Isso cabe à parte gestora das seleções, junto com ele. Então, vai ter total autonomia e liberdade para trabalhar. O que a gente precisa é dar a infraestrutura adequada para ele, segurança e lhe dar aval. Vamos blindar o Ancelotti.
Na semana passada ele teve a primeira reunião com o coordenador de seleções, Rodrigo Caetano, e o coordenador técnico, Juan. Eles seguirão nos cargos?
Seguem. São profissionais muito qualificados, aos quais tenho um apreço grande. A ideia não é mexer, retirar. A CBF tem excelentes profissionais. Só precisam de autonomia e segurança para trabalhar.
Em relação à arbitragem: no início do ano foram apresentados a nova comissão e o plano de profissionalizar a primeira turma até dezembro de 2026. Irá mantê-los?
Sobre arbitragem, a qualificação é muito importante. Trata-se de uma das profissões mais difíceis no futebol. Passam por pressões diárias nos jogos, dentro e fora de campo. São peças fundamentais nesse tabuleiro. Próximo da data Fifa a gente pensa em (manter o planejamento de) reunir a turma da arbitragem para fazer treinamento intenso específico para que cada vez mais haja uma arbitragem qualificada e possamos dar uma lisura maior aos campeonatos.
Qualificação é ponto chave. Sou uma pessoa que defende muito a educação continuada dentro de gestão. É importantíssima em todos os setores. Com certeza a arbitragem tem que ser olhada e vista com outros olhos. A capacitação vai ser mantida, e esse plano da carreira profissional só tem que ser apoiado.
A comissão será mantida?
A ideia agora é manter. Não haverá uma caça às bruxas. Vamos entrar e avaliar tudo. Mas quem está hoje à frente da comissão de arbitragem tem minha admiração e respeito. Penso em manter, sim. A gente vai fazer um estudo bem aprofundado assim que tomar posse e afinar todos setores.
Comenta-se que você levará o (advogado e ex-presidente do STJD) Flávio Zveiter como seu CEO na CBF. Pensa mesmo em criar este cargo e no nome dele?
Na verdade, o que a gente pretende é criar um conselho gestor. Nenhum nome foi citado. Tudo é especulação externa. Particularmente não parei para decidir isso. O conselho é que vai definir os profissionais mais capacitados para atuarem na gestão da CBF.
Este conselho é o colegiado de oito vices que serão eleitos com o cabeça da chapa?
Não. São profissionais com experiência em gestão. Irão fazer uma análise, estabelecer diretrizes e, em conjunto, as melhores pessoas para exercer os cargos.
Para finalizar, com sua candidatura à CBF veio à tona a informação de que, em 2020, você foi afastado por dois anos da função de perito médico do TJ de Roraima por um erro (ao invés de periciar a perna, avaliou um braço). Quer comentar essa história?
Tem muita fake news saindo em relação ao meu nome. Estou bem tranquilo, é mentira. Sou um profissional altamente qualificado e capacitado. Você acha mesmo que eu iria confundir um braço com uma perna? É complicado, mas faz parte do jogo político. Eu não faço isso, tentar rebaixar a imagem das pessoas.
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