

Em toda grande repartição, entidade ou empresa existe um etéreo, sorrateiro e disfarçado Departamento de Ideias Ruins (DIR). Ele não tem sede definida — é quase um escritório itinerante, um vaso sanitário mental que perambula entre cubículos e corredores. Se a companhia ou autarquia tem sorte… a produção desse departamento é supervisionada e controlada pelo Gerente de Bom Senso e pelo Assessor de VDM (Vai dar eMe).
A função desse departamento é singela. Uma empresa enorme precisa saber quais são as piores ideias possíveis para descartá-las cedo. Problema é que, vez por outra, companhias passam pelo tal do redesign operacional. Aparentemente foi o que ocorreu na CBF. Na correria para equacionar o orçamento ou se livrar de mais um treinador, a entidade desligou os volantes corporativos de contenção.
Essa é a hipótese capaz de explicar como uma das mais horrorosas ideias da história recente tenha sido considerada: a de fazer a seleção brasileira usar uma camisa vermelha (e preta) — um conceito tão apavorantemente ruim que esbarrou no cômico. Um devaneio terrível não apenas por infringir o estatuto da entidade — ou porque iria nos lembrar do 7 a 1. Era uma jumência siderúrgica especialmente porque no ano que vem tem Copa… e eleição.
O Brasil passou os anos recentes sofrendo com a politização da amarelinha. A direita fez da camisa da seleção um estandarte — desidratando sua melhor característica: a de ser um símbolo capaz de unir o país inteiro. Em jogo de seleção, todos se irmanavam — zé dirceus e malufs, lulas e bolsonaros, cunhas e cabrais, operários e militares, otários e malandros, amigos e inimigos.
Em anos recentes, muita gente começou a dizer que aquela não era “a camisa do Brasil” e sim a “camisa da CBF”. E aqui é importante perceber como o torcedor brasileiro separa as duas coisas: CBF e seleção. A seleção é nossa, patrimônio nacional, fonte de histórico orgulho. A imagem da CBF sempre se associou a negócios, bastidores, politicagem.
O uso eleitoreiro da amarelinha foi uma jogada eficaz. O recado no grito de guerra (“a nossa camisa nunca será vermelha”) era singelo: “eles são comunistas, nós somos brasileiros”. O resultado da eleição desmontou um pouco o meme — lembrando que o Brasil não é simples. Pelo contrário… é cromaticamente confuso, antropófago e mestiço. Nosso liquidificador tupi-nagô bate até suco de polarização — que bebemos juntos e misturados.
A camisa da seleção é de Pelé, Mané, Zagallo, Romário e Ronaldo. Não é de presidente ou político nenhum — por mais que todos, absolutamente todos, tenham tentado usá-la para faturar. E justo agora, que a polarização ensaia um levíssimo arrefecimento… que ideia poderia ser mais estúpida do que jogar gasolina na fogueira e associar a seleção ao caldeirão político? É um daqueles casos em que a gente coça os olhos e se pergunta se o responsável entrou na fila da burrice uma, duas ou dez vezes.
Felizmente, a rejeição foi tão grande que, em pouco tempo, o gerente de bom senso foi recontratado, o assessor de VDM reapareceu e a asneira não só foi abandonada como renegada. Pode dar algum trabalho – porque consta que a produção já estava encaminhada. Mas ver o Brasil fantasiado de Espanha seria bem pior.
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