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Não vai nos conduzir a boas conclusões realizar, a cada 90 minutos, tratados sobre a conjuntura internacional do futebol atual. A cada vitória sul-americana sobre um europeu na fase de grupos, decretamos que o tão falado abismo é uma lenda alimentada por analistas tocados pelo vírus do eurocentrismo. Se, mais adiante, o Velho Continente dominar as fases avançadas da Copa do Mundo de Clubes, então todas as conclusões preliminares serão rasgadas porque, vejam só, o abismo é mesmo imenso e incorrigível.
O torneio nos trouxe algo mais: a adaptação dos resultados à narrativa. Quem defende a tese da hegemonia europeia tem recorrido ao calor, ao momento do calendário e até a um suposto desinteresse para justificar tropeços. Quem simpatiza com o lado sul-americano logo devolve que, no formato tradicional do Mundial de Clubes, eram os clubes daqui que chegavam esgotados à disputa.
Todos são argumentos razoáveis. O que não cabe é pretender que um jogo de futebol seja disputado em laboratório, ou seja, isolado de qualquer elemento de contexto, seja ele a temperatura, o calendário, o tipo de gramado ou a torcida local. Times de futebol são, também, contextos. Nunca haverá um jogo sem eles.
O tradicional debate sobre em que posição chegaria um clube brasileiro, por exemplo, na Premier League é apenas uma fantasia. Onde seriam os jogos? Em que temperatura? Em que calendário? Nossos times seriam visitantes na Inglaterra e mandantes aqui no Brasil? Os ingleses viriam aqui jogar? Esse é um mundo imaginário. A discussão é imprestável.
E o que não faz mesmo sentido é desprezar toda a ordem econômica internacional do jogo, todo o fluxo das maiores estrelas sul-americanas atravessando o Atlântico ano após ano e pretender que isso não existe. Ou imaginar que um torneio de um mês, cercado de tantas circunstâncias peculiares, irá decretar que a globalização e a concentração de riqueza são uma miragem. É óbvio que há uma elite de jogadores na Europa, e que os oito ou dez melhores times daquele continente tendem a reunir, de forma perene, estrelas inacessíveis ao restante do mundo. Esta é uma doença do futebol atual, e não serão resultados de uma Copa do Mundo que nos indicarão que encontramos o remédio.
Por outro lado, o que este torneio nos lembra é que há projetos ricos e estruturados em outras partes do mundo: Flamengo, Botafogo, Palmeiras, Al Hilal… Circula dinheiro na elite não europeia do jogo. E onde há bons times e jogadores talentosos, é possível ganhar jogos. Seja resistindo a quem está no topo da pirâmide, seja enfrentando de peito aberto e dominando europeus que não estão no primeiro escalão. Porque, é sempre bom lembrar, não existe uma só Europa. A fratura no futebol pós-globalização dividiu até o Velho Continente.
É justo dizer que o calendário prejudicava os sul-americanos no antigo Mundial, mas também é obrigação de quem se dispõe a analisar futebol considerar que o torneio atual inclui calor e cansaço nas costas dos europeus. E, mais importante, a Copa não foi vista por quase nenhum deles como um fim, um objetivo, tantos são os times que estreiam treinador ou dão os primeiros passos de reformulação de elenco em plena disputa.
Então estamos perdendo tempo? De forma alguma. Qualquer torneio de futebol, da Taça Guanabara à Copa do Mundo de seleções, sempre será moldado por circunstâncias que prejudicarão mais a um do que a outro. Quem levar a taça terá feito algo grande, histórico. Porque não é fácil vencer os melhores times do mundo, qualquer que seja o contexto. Um torneio de futebol não precisa decidir qual é a ordem econômica mundial do futebol. Ele coloca em jogo uma taça. Quem ganhar, terá vivido algo eterno.
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